Dia Internacional da Mulher. O que estamos comemorando?
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8 de março. Dia Internacional da Mulher. Eu poderia falar de n coisas que me vem à mente em uma data comemorativa tão expressiva àqueles que lutam pela igualdade de gênero. Não acredito que este dia se resuma em mera comemoração; é, sim, antes de tudo, um dia de reflexão, em que se relembra o passado e se prospecta anseios futuros a partir de ações presentes.
É um dia em que destacamos o desejo em pôr a voz feminina lado a lado com a voz masculina, não em oposição, mas em justaposição, equilibrando o campo dos discursos em uma sociedade culturalmente patriarcal, onde o machismo naturalizado fez aflorar um feminismo que, por vezes, também não alcança a magnitude das ideias que o originaram, gerando uma antagonização com frutos distorcidos.
Não se trata, portanto, de aderir ou não a uma torcida e chegar aos extremos da paixão que um Fla x Flu desperta. Precisamos lidar em igualdade com a realidade que tanto assusta as mulheres e todos os que defendem nossa causa, precisamos conversar como iguais e agir como iguais para que as diferenças possam receber o tratamento adequado e, aos poucos, se esvaiam, esmoreçam na construção de uma sociedade mais justa. E que realidade seria esta? Da economia à violência, os números comprovam aquilo que está na boca de tantas de nós: a desigualdade no mercado de trabalho, com a prática de salários menores a funcionários do sexo feminino; os altos índices de violência sexual (estupro, exploração e assédio), que, para além das violações, tem causado milhares de mortes em todo o mundo; a sub-representação política feminina e até a limitação legal de sua participação; entre tantos outros problemas que resultam da discriminação do chamado sexo frágil.
Ao longo dos anos, a luta iniciada pelo movimento feminista conseguiu alterar significativamente parcelas deste cenário e a participação das mulheres em todas as instâncias está cada vez maior. Entretanto, o dia 8 de março ganhou um caráter romântico quando observamos o conceito do senso comum. Não que isso seja errado; o romantismo é uma das facetas do ser humano e permeia nossa forma de ver e agir no mundo. O problema está na exclusiva apropriação dessa característica em detrimento da poesia que impregna a revolução que se deseja, a revolução dos detalhes, a revolução que prega o respeito em suas minuciosidades.
Como comunicadora, acredito que para isso é preciso manter o exercício da memória, para que não nos deixemos levar pelos enquadramentos enviesados que se fazem dela. E é a memória de um 8 de março mais distante que quero resgatar hoje:
No dia 8 de março de 1857, em uma fábrica de tecidos situada em Nova Iorque, nos Estados Unidos, operárias iniciaram uma greve na busca por melhores condições de trabalho, como redução de carga horária (que até então era de 16 horas), equiparação salarial entre homens e mulheres (pois ganhavam apenas 1/3 do que seus companheiros recebiam) e dignidade no exercer de suas funções. O resultado foi a repressão violenta da ação; as mulheres foram trancadas e a fábrica incendiada, causando a morte de mais de cem tecelãs.
Em 1910 a data se transformou no Dia Internacional da Mulher, uma homenagem as que lutaram e as que batalham hoje para o fim da discriminação por gênero. A oficialização veio em 1975, pela Organização das Nações Unidas (ONU). De lá para cá, muitas conquistas podem ser comemoradas, como, por exemplo, as Leis Maria da Penha e do Feminicídio, sancionadas no Brasil. Mas muitas outras tristezas se acumulam, como o recente caso divulgado de abuso sexual praticado por militares e funcionários da própria ONU em troca de bens para o sustento, como água e biscoitos. Um caso polêmico mas que já vem acontecendo há algum tempo em uma entidade que trabalha a igualdade de gênero como um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), exigindo a adoção de políticas que promovam o empoderamento feminino.Como pode algo assim ser tão real e difuso em pleno século XXI? É avassalador! Coisas assim parecem pertencer a outro mundo quando a igualdade nos parece um direito tão claro.
Na minha história pessoal poucas vezes enfrentei diretamente a discriminação sexual, apesar de conviver com aquela presente no dia a dia e culturalmente enraizada, aquela para qual muitas vezes nos cegamos tamanha sua naturalização social; mas tenho inúmeras amigas que já compartilharam o peso de suas experiências. Quanto mais nos abrimos ao tema, mais percebemos a seriedade de sua emersão e debate, e vejo, particularmente, o quanto ainda precisamos (eu preciso!) nos engajar nesta causa que tanto nos diz respeito, mas que, por vezes, nos deixamos tocar apenas tangencialmente, superficialmente.
O estereótipo que acabamos por incorporar nos molda, limita a causa defendida e reforça as barreiras para sua desconstrução. Nesse cenário de elaboração a mídia executa um papel importante. A midiatização um tanto espetacularizada que se cria acerca do tema, mulher, precisa ser desdobrada para dar conta de sua complexidade. Eu, como mulher de uma região marginalizada, a Baixada Fluminense, que já sinto a exclusão devido a uma construção parcial do meu território, acredito na nossa responsabilidade, enquanto comunicadora, do rompimento dos estereótipos.
Precisamos trazer os problemas que deixamos pairando sobre nossas cabeças para o embate do mundo real, tendo-os vivido nós mesmos ou não, criando as bases para a solidificação de uma sociedade mais consciente, que hoje transcorre fluida procurando “alguéns” para se ancorar. Que possamos ser esses “alguéns” a fim de formar um “todos” em que nos diferenciemos apenas pelas nossas escolhas e não pelo que escolhem de nós.
Para mim, publicitária, comunicóloga, mulher, moradora de São João de Meriti, comemorar o Dia Internacional da Mulher, é comemorar essa luz sobre um outro caminho que nós mulheres estamos traçando e apresentando sobre nós mesmas. É entender a nossa voz como mais uma voz no todo e que, por isso, deve reverberar a todos os cantos do mundo, sem distinção, sem censura e com igual relevância. É preciso que a ideia de igualdade prevaleça sobre todos os obstáculos que nos impuserem, afinal, relembrando um personagem querido: “Ideias não são só carne e osso. Ideias são a prova de balas” (V, em V de Vingança). Precisamos ratificá-las e reforçá-las hoje, para que elas perdurem até que se alcance, no futuro, um mundo onde impere o respeito e a justiça.